sexta-feira, 13 de setembro de 2013

Vítor Damas, dez anos depois do adeus

Quando chegou ao Sporting depois de ter sido descoberto num torneio do clube na então sede, na Rua do Passadiço, nem sequer tinha idade para ser inscrito. Não se impacientou e por lá continuou, em Alvalade. 

Queria jogar a avançado, mas cedo lhe detetaram o talento para as redes. Nos principiantes encontrou José Travaços como treinador. O mítico Zé da Europa, estávamos nos inícios da década de 60, ainda tinha o bichinho de jogador no corpo. «O Travaços metia a bola onde queria e o Vítor voava, defendia quase todas. Os adeptos ficavam ali em redor do campo a apreciar aquele espetáculo. Ainda não tinha chegado aos seniores e já toda a gente o conhecia», conta o antigo companheiro Carlos Pereira. 

Andou sempre um escalão acima do seu, estreou-se pela primeira equipa em 1967, com vinte anos acabados de fazer. Passagem ainda fugaz, porque Carvalho era o dono da baliza. Dois anos mais tarde, rouba-lhe definitivamente o lugar e começa a nascer a lenda. Do outro lado da Segunda Circular, Eusébio era incontornável. E foi a duas bolas rematadas pelo king, em 1969 e em 1973, que realizou duas das melhores defesas da carreira. Carlos Pinhão, um dia, nas páginas de A BOLA, descreveu numa frase a valia do guarda-redes. «Chama-se Damas o Eusébio do Sporting.» 

Por esses anos, em 1970, resultado gordo no derby: Benfica, 5-Sporting, 1. Melhor em campo... Vítor Damas. 

Na primeira passagem por Alvalade, ganhou cinco troféus. Foi sempre o mais mal pago. «Assinava os contratos em branco. Dizia aos dirigentes que colocassem a verba que quisessem. Contas feitas, ganhava perto de dez contos (50 euros) e os colegas o dobro», lembra Francisco Caló, companheiro de uma vida. 
Personalidade forte, muito direto, fervia em pouca água mas também sabia dar a palavra certa na hora certa. Sportinguista fervoroso, mantinha características da meninice: raro era o treino em que não jogava à frente. 

Na década de 70 elevou-se ao estrelato de Alvalade, em Wembley compararam-no aos maiores após uma defesa a um remate de cabeça à queima-roupa de Trevor Francis. 

Até se chegar a Março de 1976, época negra para os leões. Dizia-se que Damas tinha assinado pelo FC Porto por uma verba inimaginável para a altura. Jogo em casa com a Académica, perto da meia hora 3-1 para os de Coimbra. O estádio assobia Damas, o guarda-redes não resiste, tira a camisola de sempre e abandona o relvado. Voltaria ainda essa temporada, após ter assinado pelos espanhóis do Racing Santander. Passa quatro anos em Espanha e é considerado o melhor guarda-redes da liga do país vizinho. 

Regressa a Portugal para o V. Guimarães, treinado por José Maria Pedroto, que há muito o namorava. Ainda passa pelo Portimonense e está no Europeu de França com os Patrícios antes de voltar à casa de sempre. 

Mais cinco épocas em Alvalade, presença no Mundial-86, até abandonar aos 41 anos, quando sentiu que já não tinha mais condições para continuar a ser um deus das balizas. Ao todo, 743 jogos de leão ao peito. Ninguém fez tantos como ele. 
Passou para treinador, dos guarda-redes às funções principais, saiu magoado, voltou e tornou a sair com dor. Mas nunca se calou ou vergou. Pouco antes de partir disse que, antes disso, gostava de estar no novo estádio, onde está imortalizado na baliza do topo sul, e que, assim, poderia morrer feliz. O destino fez-lhe a vontade, aos 55 anos. Faz hoje dez anos.

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