Colorado deu o tiro de partida. Desde 1 de Janeiro, qualquer residente com mais de 21 anos do estado norte-americano está autorizado a comprar até uma onça (31 gramas) de marijuana de cada vez (habitantes de outros estados podem comprar até um quarto de onça).
A nova lei que regulamenta a venda de canábis para fins recreativos fez história nas presidenciais de 2012, quando os habitantes do Colorado e de Washington (onde a lei entra em vigor em Fevereiro) votaram a favor da despenalização da venda de marijuana.
Em apenas cinco dias, as lojas que já conseguiram licenças para vender erva em Denver, capital do Colorado, facturaram mais de cinco milhões de dólares (o “Denver Westword” noticiava ontem que os donos dessas lojas não têm onde depositar o dinheiro, dado que os bancos se têm recusado a abrir contas para negócios relacionados com marijuana).
O anúncio pelo estado do Colorado das suas previsões de lucro com a nova lei – 578 milhões de dólares por ano em vendas e 67 milhões em impostos – fizeram estalar o frenesim pró-legalização.
OAlaska foi o último de uma série de estados a anunciar que pretende levar a votos nas intercalares de Novembro uma proposta semelhante à do Colorado, tendo já sido lançada uma petição com 46 mil assinaturas, faltando apenas 16 mil para que esta possa constar do boletim de voto nas eleições.
Campanhas semelhantes já foram lançadas entretanto por cidadãos dos estados do Maine, Arizona, Califórnia, Oregon e do distrito de Columbia, estados onde o consumo de marijuana para fins medicinais já é legal mas onde a posse, consumo e produção de erva a título recreativo são proibidos.
A onda também se alastrou a estados onde o consumo de marijuana é actualmente proibido independentemente do propósito. O governador de Nova Iorque, Andrew Cuomo, anunciou que vai usar os seus poderes executivos para conseguir que 20 hospitais do estado passem a poder receitar marijuana em casos de doença debilitante ou prolongada, como cancros, esclerose múltipla ou glaucoma.
A proposta está a ser recebida com críticas, quer pelos oposicionistas à despenalização quer pelos cidadãos que apoiam a total legalização e que acusam Cuomo – durante vários anos contra a medida – de estar a usar a questão para ganhar votos nas eleições.
Também esta semana, o senador pelo Kentucky Perry Clark anunciou que vai apresentar um projecto-lei com o mesmo fim, à semelhança dos estados da Flórida, que já tem uma iniciativa cidadã em fase de recolha de assinaturas, e do Tennessee, cuja representante Sherry Jones propõe legalizar a receita de marijuana, mas apenas em “casos de doença séria”.
Ovizinho Canadá também não escapou à euforia. Ontem, o presidente da Câmara de Toronto, Rob Ford, sugeriu que o consumo de canábis deve ser despenalizado no país. Apesar de manter o título de “mayor” da cidade, Ford perdeu a maioria dos seus poderes em Novembro, após ter sido revelado que fumou crack (um derivado da cocaína). Consumidor assumido de marijuana, Ford fez uso da questão “dinheiro” para propôr a legalização da droga leve, sugerindo que tal ajudaria os conservadores no poder no Canadá a obterem receitas para o orçamento federal.
Em tempos tido como exemplo mundial no combate ao tráfico de droga através da despenalização de posse de marijuana, o continente europeu parece agora estar a ser ultrapassado por vários países do continente americano, encabeçados pelo Uruguai.
Em meados de Dezembro, o presidente uruguaio José “Pepe”Mujica aprovou a produção e venda de marijuana, tornando-se no primeiro do mundo a fazê-lo. Desde então, Montevideo ditou que cada grama de canábis vai custar cerca de um dólar (contra os quase 200 dólares por grama nos estados dos EUA onde o consumo de marijuana para fins recreativos foi legalizado) e anunciou que vários países, como o Canadá, Chile e Israel, já se mostraram interessados em importar o produto para uso medicinal.
“Não foi intenção da lei regular a troca internacional de marijuana, mas o Uruguai está aberto e entusiasta perante essa possibilidade”, disse Diego Canépa, porta-voz do governo Mujica, há três dias.
Apenas oito dos 28 estados-membros da União Europeia têm, neste momento, em vigor leis que autorizam os cidadãos a possuir pequenas doses de canábis, ainda que continue a ser ilegal em todos eles a posse, consumo e produção da substância psicotrópica (salvo com propósitos medicinais).
Em Portugal, que integra a lista de oito países, a lei dita que “a aquisição e detenção para consumo próprio da substância não poderão exceder a quantidade necessária para o consumo médio individual num período de 10 dias”.
Mas em França, onde a posse de canábis é totalmente proibida, uma notícia de há dois dias causou espanto entre a população, quando o governo anunciou esta semana que vai pôr à venda o primeiro medicamento à base de substâncias da planta de marijuana no país, após aconselhamento da agência que regula os medicamentos.
Tendo como base os dois principais componentes da erva, o canabidiol e o delta 9-THC, o spray Sativex tem agora o aval do Ministério da Saúde francês para tratar espasmos musculares associados à esclerose múltipla.
De acordo com a farmacêutica britânica GW Pharmaceuticals, que produz o fármaco, o spray já está a ser comercializado em 11 países e já foi aprovado por mais de outros dez países, incluindo Portugal, onde a Infarmed deu aval à comercialização em Junho de 2012.
Paralelamente, e no sentido contrário, o governo conservador de Mariano Rajoy está a ponderar endurecer as medidas de combate à droga. Uma notícia do “El País” de 3 de Janeiro dava conta de que os populares pretendem aprovar a chamada Lei para a Protecção da Segurança dos Cidadãos, que, entre outras medidas, prevê o aumento da sanção mínima para a posse de estupefacientes de 300 para 1000 euros e elimina a possibilidade de substituir o pagamento da coima por tratamentos de desintoxicação.
Até à votação dessa lei, Espanha continua, contudo, a integrar a lista de países onde a posse já foi despenalizada. A lei dita que qualquer cidadão pode possuir “duas plantas para consumo próprio e privado”, o que, desde 2010, tem dado margem para contornar a lei aos mais de 40 clubes privados que vendem erva em Barcelona, na Catalunha. Em Dezembro passado, o “El País” noticiou que estes bares têm facturado mais de cinco milhões de euros por mês.
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